A informação de que seria possível aumentar em pelo menos 40% a
participação de três fontes renováveis alternativas — eólica, biomassa e PCHs
(Pequenas Centrais Hidrelétricas) — nos leilões de energia nova vem em bom timing. As grandes
hidrelétricas têm sido alvo de mais uma rodada de questionamentos: o Tribunal
Regional Federal chegou a determinar a suspensão das obras de Belo Monte, para
que os índios afetados sejam consultados pelo Congresso Nacional sobre os
impactos da usina, e há poucas semanas o Instituto de Estudos Socioeconômicos
(Inesc), alertou que as hidrelétricas na Amazônia vão alterar para sempre a
configuração ambiental, social, e territorial da região, enquanto o governo dá
mostras de sua dificuldade em avaliar, evitar e mitigar os impactos gerados
pelas obras.
Não que energia
renovável alternativa seja sinônimo de sustentabilidade. Se feitas de qualquer
maneira, suas aplicações também vão gerar impactos, diz Carlos Rittl,
coordenador do Programa de Mudanças Climáticas e Energia do WWF-Brasil. “Não
basta ser renovável. Esse é o discurso do governo para defender as grandes
hidrelétricas. É fundamental definir a melhor forma como essas alternativas
devem ser implantadas.”
Feitas essas
ponderações, Rittl afirma que, com alguns incentivos, é totalmente possível
fazermos uma revolução na matriz energética brasileira nas próximas décadas.
Ele se refere à pesquisa lançada ontem, 15 de agosto, intitulada Além de grandes hidrelétricas:
políticas para fontes renováveis de energia elétrica no Brasil.
O estudo,
apresentado durante o VIII Congresso Brasileiro de Planejamento Energético, em
Curitiba , mostra que a participação de cada uma dessas fontes alternativas
poderia crescer no mínimo 10% nas avaliações mais pessimistas, sem significar
aumento de custos, desde que recebam os incentivos corretos – o que faz todo o
sentido quando o Brasil anuncia compromissos de redução de emissões.
O trabalho foi
encomendado pelo WWF, supervisionado por Gilberto de Martino Jannuzzi,
professor da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e do International
Energy Initiative para a América Latina (IEI–LA), e coordenado pelo Paulo
Henrique de Mello Sant’Ana, da Universidade Federal do ABC e do IEI-LA.
Segundo
Januzzi, em comunicado à imprensa, “o futuro não está mais em grandes
projetos hidrelétricos e muito menos no uso continuado de fontes fósseis. “Há
formas de tornar as fontes alternativas ainda mais competitivas, por meio da
criação de novos subsídios ou do redirecionamento dos já existentes, mas que
estão atualmente voltados a viabilizar as fontes fósseis.”
Rittl conta o
objetivo do estudo é fomentar o debate, mostrando que há alternativas ao
alcance do governo – basta ter vontade política e saber usar. Mas,
questionado sobre o grau de permeabilidade do poder público ao diálogo,
respondeu com uma informação: por lei, é definida a participação de um
representante da sociedade civil no Conselho Nacional de Política Energética,
mas isso nunca foi cumprido.
Enquanto isso,
o estudo revela o gap entre
o potencial brasileiro de geração de eletricidade das fontes alternativas e a
capacidade instalada e outorgada no País. Dos 2.400 empreendimentos de geração
de energia elétrica em operação em 2011, apenas 777 usavam fontes renováveis
que, juntas, podiam produzir 12,3 milhões de kW.
A seguir,
alguns dados do estudo:
- · Em termos comparativos, somente a energia eólica já apresentava, em 2001, um potencial de geração de energia elétrica de 143 milhões de kW. Passados 11 anos, estima-se, em 2012, um potencial de 300 milhões de kW de energia gerada pelo vento. Esse total é superior ao dobro da capacidade total instalada no Brasil, que é de mais de 114 milhões de kW, considerando-se todas as fontes geradoras.
- · Se o lago de Itaipu fosse coberto hoje com painéis fotovoltaicos, a geração de energia solar ao ano seria de 183 TWh, o equivale ao o dobro de toda a energia que aquela usina produziu em 2011 (92,24 TWh).
- · Outra fonte com potencial subaproveitado é a biomassa com uso de cana-de- açúcar. De 440 usinas desse tipo em atividade no Brasil, só 100 delas produzem eletricidade. O potencial de geração de eletricidade estimado só para esta fonte era de 14 milhões de kW em 2009.
- · Com relação aos custos de produção, existe no Brasil uma tendência de queda nos próximos 10 a 15 anos das fontes eólica, biomassa (cana-de-açúcar), enquanto, no mesmo período, há tendência de elevação dos custos das usinas hidrelétricas.
Amália Safatle